Quando falamos de plano de saúde, basicamente podemos observar dois efeitos da negativa de exame por parte das operadoras: uma percepção ruim nos pacientes e o risco de multas e punições. Diante dessas ameaças, é fundamental dedicar atenção ao tema e refletir sobre como minimizar os problemas.
Pois é exatamente essa a nossa proposta com este texto. Contudo, essa questão envolve muito mais do que o interesse dos grupos envolvidos. A própria viabilidade do sistema de saúde depende de políticas eficazes e responsáveis de autorização. Confira!
A frustração do paciente com a negativa de exame
É preciso assumir uma atitude empática em relação à percepção do paciente. Quanto mais competente e reconhecido for o médico, mais ele transmite confiança e, quando indica determinado exame, passa a ideia de que ele é imprescindível, seja para afastar a possibilidade de uma doença, seja para confirmá-la.
Na maioria dos atendimentos, o médico enfrenta uma expectativa de tratamento. Mesmo quando não há necessidade, os pacientes esperam receber a receita de um remédio, de um exame ou, no mínimo, a indicação de repouso ou outro tratamento.
Também notamos a ocorrência de exploração desse estado de necessidade e ansiedade instalado nas pessoas. Na área da saúde, ocorre um comércio velado que, no final, tem grande influência no processo de decisão a respeito de qual exame solicitar.
Sob essa influência, a frustração com a negativa de exame é ainda mais significativa. O usuário de planos de saúde se prepara para uma “cruzada” quando surge a necessidade de aprovação. Nesse processo, ele carrega uma expectativa que vai além de garantir a sua saúde. Em alguma medida, ele também está preocupado com seus direitos e espera conseguir um retorno objetivo do plano.
A relação entre o plano de saúde e os pacientes
No Brasil, o plano de saúde está entre uma das seis inscrições mais reclamadas no Procon. Em geral, cada consulta envolve a solicitação de três a cinco exames. São milhares de solicitações efetuadas mensalmente e isso potencializa a chance de frustração.
Como consequência, ocorre desgaste da imagem do plano de saúde. Por isso, ao se estabelecer um mecanismo de regulação e controle que pode negar uma solicitação de exame, é preciso se preparar para as repercussões.
Essa preparação envolve o processo de análise, mas também a forma como a negativa é comunicada. Não se trata apenas de responder negativa ou positivamente, mas de como essa informação chega ao paciente.
Quanto mais fria e formal for a resposta, maior a tendência de que o paciente se sinta apenas um número. Ou seja, a expectativa não está limitada à execução de um procedimento, mas envolve a atenção e o cuidado que o interessado recebe de uma empresa que, em sua percepção, existe para prestar assistência a ele.
A possibilidade de multas, punições e cancelamentos
Toda essa expectativa favorece que os pacientes busquem reverter qualquer negativa de exame. Trata-se de uma ameaça de ordem pecuniária na qual o sujeito inconformado faz um registro de chamada de Notificação de Investigação Preliminar (NIP) junto à Agência Nacional de Saúde (ANS), órgão que faz a macro regulação do setor.
No fim das contas, esse procedimento se tornou uma forma de forçar os planos de saúde a fazerem tudo. Por exemplo, se há uma negativa para a realização de um exame de sangue em uma urgência, a agência a considera indevida. Se houver uma negativa conscienciosa de um item como esse, a ANS aplica uma multa de R$ 40 mil.
Também existe o prejuízo decorrente de sanções do Ministério Público por meio das procuradorias do consumidor. Além disso, o sujeito pode ingressar em juízo. Quando as ações são ajuizadas, o magistrado costuma desprezar a legislação que disciplina a relação entre a operadora de plano de saúde e os usuários.
Em vez disso, prefere aplicar o Código de defesa do Consumidor (CDC). Isso pode levar a desconsideração dos períodos de carência, por exemplo, que estão previstos na legislação especifica, mas não no CDC.
A importância de um controle eficiente
Se o plano de saúde trabalha com médicos credenciados, eles ficam à vontade para estabelecer seus próprios critérios, isso quando não são estimulados pelos prestadores de serviço de diagnóstico à solicitação exagerada de exames.
Essa é uma ameaça ao plano de saúde porque a tendência é que o custo assistencial aumente e comprometa a saúde financeira da operadora. De acordo com a ANS, 85% da receita das operadoras de plano de saúde são gastas com pagamento de rede assistencial.
Por isso, o plano de saúde se encontra em uma situação que precisa ser administrada. Se ele autoriza um procedimento que considera indevido, o custo assistencial torna a operação economicamente deficitária e o sistema sofre com essa ação.
De outro lado, se ele é restritivo nessa concessão, fica sujeito a um prejuízo na sua imagem e, ao mesmo tempo, as negativas favorecem os custos pecuniários, como multas da ANS e sanções de natureza civil no judiciário.
As redes próprias de atendimento
Como esse é um negócio complicado, as operadoras buscam criar redes próprias de atendimento, com médicos contratados e laboratórios de exames e de imagens. No Brasil, as grandes gestoras, como a Amil e a Intermédica NotreDame, são exemplos de redes verticalizadas.
Elas têm médicos, laboratórios, clínicas de exames de imagens e hospitais de sua propriedade, mas mesmo assim ainda surgem problemas de autorização. Nesse contexto, existem três situações relacionadas ao bem-estar do beneficiário que devem ser consideradas. São elas:
- o médico é bem preparado e tem convicção da necessidade de um exame;
- o médico é mal preparado e pede exames em profusão;
- o médico é estimulado financeiramente a solicitar o exame.
Para disciplinar essas ocorrências, é necessário que seja adotada uma abordagem técnica. Desse modo, o médico fica sem argumentos caso exista uma motivação alheia ao bem-estar do paciente.
Como as solicitações do médico formam um histórico sobre o seu comportamento, a qualquer momento pode-se entrar em contato com ele para fazer observações dessa natureza. Isso permite a identificação de desvios éticos e práticos e a definição de regras e atitudes com o objetivo de minimizar o problema.
Além disso, é fundamental intensificar e melhorar a qualidade do relacionamento com o objetivo de engajar a rede. O problema é real e atinge a todos os envolvidos.
No final, nenhuma das partes tem interesse em inviabilizar os planos de saúde com um custo assistencial proibitivo e nem desejam evitar exames que são realmente necessários, pois uma política preventiva é muito mais eficiente, seja em termos de bem-estar, seja em relação à saúde financeira do sistema como um todo.
Por isso, podemos concluir que os efeitos da negativa de exame devem ser minimizados, com atenção especial ao diálogo transparente, técnico e objetivo sobre o problema. A solução passa pela construção de canais de comunicação eficientes, monitoramento sistêmico das falhas de conduta e adoção de uma abordagem humana, empática e saudável com as pessoas, mas que também preserve as finanças. Como envolve vários públicos diferentes, não significa que seja fácil estabelecer a sinergia ideal.
Mas ela é alcançável. Confira a postagem complementar que separamos para você: “Usuários, prestadores de serviço e operadoras de saúde: o match perfeito é possível?”